O racismo não dexiste

Nas páginas brancas de um livro infantil sobre a vida de um homem negro escrito por homens brancos, crianças negras estão no porão de um navio negreiro brincando de pular corda com correntes e de escravos de Jó enquanto navegam rumo à escravidão naquele que virá a ser, graças ao hercúleo esforço das seculares elites eugenistas, o paraíso da democracia racial. Os escritores e a editora – pelos quais devemos ter dó, tadinhos, pobres inocentes cheios de boas intenções –, justificam a absurda romantização da escravidão do povo negro, ali posta em preto e branco, afirmando que foram levados ao erro pela encantadora história de Luiz Gama – na lógica branca, a culpa é sempre da vítima –, sem nunca consultarem especialistas no assunto. Afinal, que brancos precisam de negros para contarem a história dos negros? Eles sabem de cor…

Nas ruas de uma cidade no interior do Rio Grande do Norte, vemos um jovem quilombola de mãos e pés amarrados recebendo em seu corpo pontapés desferidos por um homem que, em seguida, o arrasta pelas ruas, atitude que declara orgulhosamente que faz e fará de novo sempre que precisar. O rapaz, em situação de rua por ter perdido os pais, foi acusado pelo comerciante bolsonarista de ser “bandido e drogado”, motivo pelo qual o rapaz jogou pedras em seu estabelecimento, o que veio a justificar o crime de racismo, visto pela polícia local como mera lesão corporal, ao passo que o rapaz – na lógica branca, a culpa é sempre da vítima – foi autuado por depredação. O espetáculo foi testemunhado por pessoas que não fizeram nada além de pedir para que as agressões cessassem. A certeza da impunidade garante ao racista o direito e o dever de ser racista.

Nesse exato momento, em algum lugar deste imenso país, uma mulher negra, um homem negro, uma criança negra foi vítima de racismo, pela bala, pela mão, pela palavra. Acontece tanto e tão rápido que o tempo verbal se vai diante dos olhos, tal qual se altera o sentido da palavra que incomoda não pelo erro ortográfico, mas por carregar o peso de uma das maiores mentiras já contadas e perpetuadas da história.

O racismo existe. O racismo não desiste.

Não existe capitalismo sem racismo.

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